Harry Potter entra na adolescência e vive
os problemas de afirmação típicos dessa fase
Marcelo Marthe
Harry Potter chegou à adolescência. E, como tal, sente o efeito dos hormônios em ebulição: tem raiva de tudo e de todos, revolta-se com seu destino, está inseguro e ansioso. Assim o personagem ressurge em Harry Potter e a Ordem da Fênix(tradução de Lia Wyler; Rocco; 704 páginas; 59,50 reais), a quinta aventura da série criada pela escocesa J.K. Rowling, cujo lançamento nacional estava previsto para sábado 29. Se o amadurecimento já se insinuara no livro anterior, Harry Potter e o Cálice de Fogo, agora salta aos olhos: aos 15 anos (contra 11 no começo da série), ele está mais alto, desengonçado e questionador – como, de resto, ocorreu também com seus colegas Rony e Hermione. Fazer com que um personagem que se tornou modelo ficcional para milhões de crianças passe por uma mudança como essa é uma operação delicada, mas a escocesa J.K. Row-ling deu-se bem na tarefa. Não existe ruptura entre este livro e os anteriores. "Potter ficou mais complexo, sem perder suas características essenciais: a coragem, o companheirismo e a autodisciplina", diz o psicanalista Renato Mezan, que é fã da série. Além de não haver uma quebra radical com o universo ao qual os leitores estavam acostumados, outro fator ajuda a manter a identificação com o público-alvo da série: na vida real, também esse público está passando por um processo similar. O ator Daniel Radcliffe, que interpreta Potter no cinema, é um exemplo ambulante disso: entre o lançamento do primeiro filme, em 2001, e hoje, o rapaz deu uma espichada e tanto.
Assim como acontece nos demais livros da série, a ação de A Ordem da Fênix cobre um ano de aprendizado do personagem na escola de magia de Hogwarts. Ao final da história, fica uma nota de melancolia inexistente nos títulos anteriores. Isso ocorre não apenas porque o enredo é ligeiramente mais sombrio que de costume – no livro, o vilão Voldemort usa de sua conexão mental com o herói para fragilizá-lo e tentar destruí-lo. A questão é que Potter começa a se defrontar com o peso da responsabilidade e encarar o fato de que está virando adulto. Em suas palavras, não agüenta mais a expectativa de ter de "salvar o mundo". Ele descobre algo decepcionante a respeito de seu pai (que morreu quando ainda era bebê) e vive a insegurança dos primeiros passos no amor, ao fazer cortes desajeitadas à sua amada Cho Chang. O mais dramático de tudo, Potter enfrenta a morte de um de seus companheiros mais chegados.
Ao se tornar um fenômeno, nos anos 90, Harry Potter ganhou não só uma legião de admiradores, como também uma claque de detratores. Recentemente, a escritora inglesa A.S. Byatt juntou-se a ela. Num ensaio azedo, em que faz uma análise freudiana do novo livro, a autora concluiu que o personagem está se tornando um "adulto infantilizado". Opiniões como essa, é claro, não provocam nem um arranhão em sua trajetória de sucesso. A febre em torno de Harry Potter continua a mesma. Quando A Ordem da Fênix foi lançado nos Estados Unidos e na Inglaterra, em junho, 7 milhões de cópias esgotaram-se em um dia. No Brasil, a tiragem inicial é recorde: são 300.000 exemplares, 100.000 a mais que a do último romance de Paulo Coelho, o recordista anterior. Os negócios de J.K. Rowling, que vendeu 250 milhões de livros ao redor do planeta, vão de vento em popa. Com fortuna estimada em 468 milhões de dólares, ela já seria, segundo a imprensa inglesa, mais rica até do que a rainha Elizabeth II. Com o terceiro longa-metragem do bruxinho chegando aos cinemas no ano que vem e um quarto em pré-produção, seus lucros certamente estão longe do fim.
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"A mão de Cho Chang estava em cima da mesa, e Harry começou a sentir um impulso crescente de segurá-la. Então segure-a, disse a si mesmo, enquanto uma fonte de pânico e excitação jorrava em seu peito. Mas, na hora em que Harry estendeu a mão, Cho retirou a dela da mesa. Estava agora observando Rogério Davies beijar a namorada com uma expressão levemente interessada.
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